Guardando o imaginário
Vou lhes confessar uma coisa:
Guardo em mim uma tal inocência perdida que não deixo ir!
Aquela inocência infantil, secreta, que vem ao nascer e some aos 8 anos...
A guardei! A guardei em mim e a procuro as vezes...
Tenho uma alma infantil... Gosto de saber o gosto das coisas como se fossem uma primeira vez...
Talvez tenha algo haver com a magia... A magia da descoberta do desconhecido, sabe?
Então, guardo em mim minha tal inocência... E finjo as vezes! Talvez, na realidade, seja uma grande fingidora!
Quando era pequena, sempre quis ser atriz! Atriz de cinema, como a tal de Marlyn, aquela com a pinta na cara... E sonhava com um espelho de camarim, com luzes ao redor, em meu quartinho cor- de- rosa bebê, com cortinas no mesmo tom e um lustre de palhaço no teto.
Sonhava com uma penteadeira de gente famosa, com muita maquiagem, pentes e escovas! Sim, eu era menina. Menina pequena, como tantas outras... E gostava, de fingir ser adulta, mulher crescida, com maquiagem na cara e a tal pinta! Lembro-me de pegar lenços e colares de mamãe, calçar seus sapatos de salto, fazer um cigarro de papel e pegar minha bolsinha prata e andar interpretando no meu quarto... Eu me sentia a Marlyn, mesmo sem saber direito quem ela era.
O espelho de astro de cinema, nunca tive, mas coloquei na porta de meu quarto, certa vez, uma grande estrela amarela... Dessas estrelas que as crianças desenham, pois nunca tive Dom pra fazer estrelas... Elas são muito simétricas e isto me assusta! Sempre fui assimétrica e, mesmo quando passava pó de arroz no rosto para ficar pálida como uma gueixa e batom vermelho nos meus lábios carnudos para ressaltá-los, sempre colocava a tal pinta no lado esquerdo... Era para um lado ficar diferente do outro!
Minha mãe era boazinha comigo e me deixou escolher minha penteadeira na loja, junto com minha cama e minha mesinha de cabeceira... queria tudo rosa, cor de menina, mas acabei por gostar mais do branco! Quando a tal penteadeira chegou, senti uma nostalgia de felicidade! Estourei todas as bolhas do plástico que veio junto com ela e fiquei horas sentada em sua frente, em meu trono de pequena princesa... Penteando meus longos cabelos negros de japonesa, fazendo caras e me pintando... Era como interpretar Marlyn, mesmo sem querer...Fingia... apenas, fingia!
E guardo comigo até hoje essa coisa gostosa da nostalgia da felicidade, sentida com o descobrimento do imaginário! Não quero nunca perdê-la...
Serei para sempre uma fingidora!
Assim, posso ser quem quiser...
Sem me cansar de mim...
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